sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016
Bar é poesia (Dizem)
Dizem
(luiz alfredo motta fontana)
Dizem
no Olimpo
que trombetas ecoam
dizem
no mesmo Olimpo
que tias revoam
dizem
que contratos se fecham
nos cartórios do Olimpo
dizem
e se dizem
dúvidas não há
o Olimpo
despe-se de musas
tudo se reduz à taxas e guias
terça-feira, 26 de janeiro de 2016
Bar é poesia (Hoje)
Hoje
(luiz alfredo motta fontana)
O poeta equivocado
transformou em musa
quem, desnuda, desfilava a própria fuga
Versos buscaram sonhos
nos entreatos de tuas vergonhas
O poeta equivocado
criava jardins em cantos
orquídeas floresciam
enquanto vestias
falsas roupas intimas
O poeta equivocado
ao acordar já não sorri
lava a poesia
enxágua os versos
rasga velhos poemas
Quem foi musa
agora veste
sociais miçangas
O poeta?
envelheceu
Hoje não comemora
apenas esquece
terça-feira, 19 de janeiro de 2016
Bar é poesia (Poemeto cínico)
Poemeto cínico
(luiz alfredo motta fontana)
Com estridência,
em seu tom gutural,
esboçava risadas.
A cada tragada,
arqueava os ombros,
cobertos em cambraia branca
Afinal...
seus instintos reprimidos,
e jamais confessados,
de donzela quase invícta,
testemunharam:
A última dança do casal,
um bolero singular,
um prá lá, um prá cá!
Bar é prosa (Em nome da Comenda)
Em nome da Comenda
(luiz alfredo motta fontana)
Francesco Altileme Filho, era herdeiro, do nome, do sobrenome, e de regras de comportamento.
Herança envolvente, asfixiante, duradoura, da qual ousava escapar, somente, na privacidade da "sala de música", envolta em paredes de cortiça, pesadas cortinas e poltronas de outrora, revestidas em couro.
Em outros cômodos, ou na rua, era sempre o herdeiro, do primeiro Francesco, que em dia de glória, adquirira o sonhado título de Comendador, data que culminou com o jantar planejado, tendo como convidado principal, Dom Giuzeppe, “o Breve”, Bispo de larga fronte e enormes costados.
Homem feito e refeito, embora ainda sob o peso da herança, Francesco vencera, pertencia ao mundo empreendedor, brilhava em reuniões, como o principal executivo, da filial paulista, de robusta empresa européia.
Ao estacionar na vaga perfeita, do supermercado das manhãs de domingo, uma pequena lembrança lhe acometeu, quase que ouvia o barulho, infantil, do chacoalhar da caixa de papelão.
Em meio ao labirinto de corredores e gôndolas, qual aventureiro em terras longínquas, sentia o gosto do conteúdo, desfazendo-se no céu da boca.
Abraçado ao objeto de desejo, quase não percebeu o olhar , entre curioso e sarcástico, que Altaneira Venâncio, Diretora de Marketing, sala ao lado da sua, lançava, ora para seu rosto distraído, ora para a escandalosa caixa ilustrada.
Ao responder o “Bom Dia”, um tanto quanto estridente, encontrou a solução, qual mágica, vinda de sua, elogiada e reconhecida, capacidade de reação e improvisação frente aos desafios de mercado.
E, com ar professoral, discorreu sobre singela receita, do que chamava, “Filé do Comendador”.
Aproveitando-se da proximidade do balcão de cortes bovinos especiais, escolheu com enfado a embalagem de “tournedos” de filé, e dois passos à frente, um vidro de maionese light.
Naquela tarde, enquanto buscava o conforto no barroco de Bach, sorria ao imaginar o sucesso da receita.
“Filé do Comendador”
Ingredientes:
- quatro tournedos de filé
- sucrilhos tradicionais (o da caixa da infância)
- maionese light
Preparo:
- untar os tournedos com maionese
- após, passá-los numa vasilha contendo sucrilhos
- levar ao forno médio
Servir acompanhado de escarolas cozidas, ao tempero de azeite.
Francesco manteve sua postura, com pitadas de excentricidade.
A tigelinha de ágata, comprada na feirinha de antiguidades, repousava ao lado, úmida de leite, e pontuada de sucrilhos.
Bar é prosa (O cinema, o domingo, as moças, os sonhos...)
O cinema, o domingo, as moças, os sonhos...
(luiz alfredo motta fontana)
Vila Santana, anos sessenta, população pequena, a praça em frente à igreja, a rua principal, com todos os bares, o Correio, ao lado a única agência bancária.
O domingo era todo descanso, calmo, o som do Serviço Municipal, substituia o chiado dos rádios a válvula, desfilando boleros, mambos, valsas e sambas-canções.
A noitinha o murmurinho na praça, frente à igreja, anunciava a sessão semanal do pequeno cinema, um sucesso com Victor Mature, ou Randolph Scott.
As moças, e como eram belas as moças da época, caminhavam no sentido horário, alternando risos breves, com cochichos e ares de anjos. Os moços, por sua vez, em harmônica e estudada indiferença, caminhavam em sentido inverso, escondendo intenções entremeadas com apelos.
Laquês, rouges, saias plissadas, de um lado; de outro, botas e botinas engraxadas, dois ou três sapatos de bico fino, isqueiros Ronson, ou Zenith, um ou outro chapéu, estes sempre em parceria com lenços amarrados no pescoço.
Os sonhos, embalados com "Caubys", "Angêlas", e até mesmo "Galhardos" distraídos, dirigiam-se, por fim, lenta e ordenadamente, para a bilheteria.
Quando cheio o salão, as cortinas fechavam, o Canal 100, desfilava novidades da capital, o trailer convidava ao programa da semana seguinte, e por fim, o velho e bom sucesso da Metro ou Columbia, iniciava.
Quantos papéis de balas lançados no corredor, quantas lágrimas sensíveis em lenços finos colhidas?
Após a sessão, a magia rotineira, sem que se percebesse, as ruas restavam vazias, apenas o sobrevoo de um ou outro pássaro noturno, ou então, o deslisar, rente aos muros, dos gatos em ciranda conhecida.
Vila Santana adormecia, pronta para o amanhecer em renovada labuta campestre, por caminhos nem sempre firmes, em atoleiros que desafiavam os mais hábeis, em campos e pastos a serem cotidianamente conquistados.
Hoje, em contraponto, "Matures" já não são lembrados, "Caubys" mal frequentam o Brahma, meninas usam blush, domingos, por sua vez, terminam em angústia que precede as segundas sem prazeres.
- Alguém viu minha Crush?
segunda-feira, 18 de janeiro de 2016
Bar é poesia (O plano)
O plano
(luiz alfredo motta fontana)
Calçada
limite do andar
Esquina
o novo, pronto para usar
Tropeças
Voltas
amanhã recomeças
Bar é poesia (Parte vencedora)
Parte vencedora (lições de Direito)
(luiz alfredo motta fontana)
Nunca fora tão bem-vindo
Jamais, tão espirituoso
A noite era sua
As pessoas, sorrisos
As mulheres, promessas
O que mudara?
Enfim, a liquidação da sentença
Afora os honorários devidos
O fisco satisfeito
Pôde ainda,
sem receios,
tornar-se conviva
quarta-feira, 13 de janeiro de 2016
Bar é poesia (A noite, o bar, o intruso)
A noite, o bar, o intruso
(luiz alfredo motta fontana)
O gelo tem vida própria
O scotch personalidade
Da mesa, boa visão
O barman, um velho amigo
A noite, promessas
Já aquele cara que acaba de entrar
curvado e pálido
o peso da inveja!
Garçon, um incenso!
terça-feira, 12 de janeiro de 2016
Bar é poesia (era)
era
(luiz alfredo motta fontana)
era drama
era sério
era destino
alguém assoviou um charleston
tudo ficou para depois
resistir?
como?
segunda-feira, 11 de janeiro de 2016
Bar é poesia (O brinde)
O brinde
(luiz alfredo motta fontana)
Ao despedir-se
desnudou-a
Ao dizer adeus
revelou-a
ela, apenas engano
Sorria novamente
o garçon renovara o gelo
a realidade era fria e transparente
o malte, ao contrário, aquecia
o brinde selava a descoberta
sábado, 9 de janeiro de 2016
Bar é poesia (teus passos)
teus passos
(luiz alfredo motta fontana)
teus passos
ferem o corredor
ainda exalam meus desejos
teus passos te levam
os meus,
não se atrevem, quedam-se
teus passos
silenciam além do corredor
adormeço
amanhã,
buscarei teu rastro
quarta-feira, 6 de janeiro de 2016
Bar é poesia (quase um bolero)
quase um bolero
(luiz alfredo motta fontana)
a chuva fina
não permitia fumar
não permitia fumar
a calçada, irregular, aconselhava
melhor não apressar o passo
a sola lisa desafiava escorregares
três quarteirões antes
acordara em meio à noite
ela dormia
depois do bar quase deserto
do riso aberto em decote
sua última frase, fora o alerta
- precisamos conversar
levantara-se, sem barulho,
vestira-se no corredor
na varanda, calçara-se
agora a chuva apagava o rastro
garantia o não retorno
era só virar a próxima esquina
já não sorria
apenas mantinha
o passo lento
e o adeus calado
quase um bolero
terça-feira, 5 de janeiro de 2016
Bar é poesia (Prelúdio)
Prelúdio
(luiz alfredo motta fontana)
A simetria confessava
o plano era perfeito
As cores sublinhavam
era clássico o estilo
Tua nudez
tensa, úmida
anunciava
Era meu
o desejo
Seria teu
o entreato
segunda-feira, 4 de janeiro de 2016
Bar é poesia (Suores)
Suores
(luiz alfredo motta fontana)
tardes são longas
demoram
parecem reter o tempo
tardes envelhecem
perdem o viço
fenecem
tardes morrem sem luares
talvez por isso
choram suores
tardes persistem
domingo, 3 de janeiro de 2016
Bar é poesia (Sem pena do trema)
(luiz alfredo motta fontana)
mutilaram o sagüi
por decreto
tiraram-lhe o trema
sem pena
tiraram-lhe o trema
sem pena
eloqüente
o pingüim argüiu
o pingüim argüiu
agüentaremos?
sábado, 2 de janeiro de 2016
Bar é poesia (Exílio)
(luiz alfredo motta fontana)
Ao acordar
pressentiu...
Ao tomar consciência
desesperou...
isolado,
desterrado,
banido.
Uma pena a cumprir?
Uma sentença sem apelação?
O pior dos homens?
Não...
...apenas a conexão com defeito!
quinta-feira, 31 de dezembro de 2015
Bar é poesia (Fim da folhinha)
Fim da folhinha
(luiz alfredo motta fontana)
Fim da folhinha
promessas vãs expiram
Fim da folhinha
culpas e medos
Fim da folhinha
lava-se em branco, manchas e marcas
Fim da folhinha
sobreviver ainda é possível
para além do derradeiro dia
quarta-feira, 30 de dezembro de 2015
Bar é poesia (Refaz)
Refaz
(luiz alfredo motta fontana)
No fim do banho
o começo do dia
aroma renovado
Bar é poesia (Desalento)
Desalento
(luiz alfredo motta fontana)
O violão sem cordas
testemunha do abandono
repousa em mesa ao centro
Ao lado dele
velho cachimbo
frio, sem tabaco, sem cheiros
faz companhia à garrafa vazia
com rótulo escocês
No chão, folhinha antiga
dias marcados
significados perdidos
Na parede, o retrato
musa abandonada
sem direito à versos
esboça ainda
Na parede, o retrato
musa abandonada
sem direito à versos
esboça ainda
um sorriso amarelado
terça-feira, 29 de dezembro de 2015
Bar é poesia (Trégua)
Trégua
(luiz alfredo motta fontana)
Para além do mamoeiro
Sanhaço imita o céu
O menino
por tédio
aposenta o estilingue
por tédio
aposenta o estilingue
Sabiás flauteiam
A tarde dormita
escapando entre meus dedos
Não há juras
nem anéis
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